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Notícia

Poupança é obstáculo para juro menor

Segundo presidente do BC, Henrique Meirelles, taxa Selic mais baixa depende do fim da TR, o que reduziria a rentabilidade da caderneta

Fonte: Correio Braziliense

 Vicente Nunes e Vânia Cristino


Com a inflação sob controle e o nível de atividade minguando, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, identificou um novo empecilho para a queda mais acentuada da taxa básica de juros (Selic), que, anteontem, caiu 1,5 ponto percentual, para 11,25% ao ano. Segundo relatos de senadores que integram a Comissão Temporária de Análise da Crise do Senado Federal e estiveram no BC ontem, Meirelles destacou que, se o rendimento da caderneta ficar acima dos juros reais embutidos na Selic, há o risco de haver uma fuga de recursos que hoje estão aplicados em títulos públicos em direção à poupança, criando embaraços para o governo financiar a dívida pública no mercado.

Ainda segundo relatos dos senadores, o presidente do BC afirmou que, com o mais recente corte da Selic, os juros reais (que descontam a inflação projetada para os próximos 12 meses) ficaram um pouco acima de 6%. A poupança, por sua vez, paga 6,17% ao ano além da variação da Taxa Referencial (TR), que eleva seu ganho para um patamar entre 7% e 7,5%. Portanto, na visão de Meirelles, uma das saídas imediatas para corrigir o “problema” seria a extinção da TR, eliminando um dos últimos resquícios da indexação que, ao longo de décadas, dominou a economia brasileira. A TR pode ter fim ou ser zerada por meio do Conselho Monetário Nacional (CMN), do qual Meirelles é um dos três integrantes.

Questionado pelo Correio sobre possíveis mudanças no rendimento da poupança para abrir espaço a reduções maiores dos juros, o presidente do BC respondeu, por meio de sua assessoria de imprensa, que o “relato feito aos senadores foi o mais objetivo possível”. Ele destacou também que as distorções que serão criadas por meio de juros reais cada vez menores e os rendimentos da caderneta têm sido motivo de alertas de analistas e investidores há tempos. Segundo ele, “essa questão, inclusive, foi levantada em 1987”, quando a Selic estava em franco processo de baixa. Meirelles disse que a TR é um instrumento dos tempos de hiperinflação.

A despeito disso, Meirelles ressuscitou o tema, no momento em que o governo está finalizando um prometido — e adiado — pacote habitacional. A extinção da TR, por exemplo, baratearia consideravelmente a prestação da casa própria. Atualmente, pelas contas da Caixa Econômica Federal, mais de 90% dos financiamentos imobiliários são corrigidos pela TR mais uma taxa fixa de juros. “Trata-se de um apelo e tanto para bancarmos o fim ou a zeragem da Taxa Referencial. Resta saber se há disposição para comprar brigas com os poupadores e os trabalhadores que têm recursos no FGTS”, frisou um técnico do governo. “Independentemente dos interesses, o BC têm de estar muito atento aos riscos de desestruturação dos sistemas financeiro e de poupança”, emendou.

Prós e contras
Para os bancos, a extinção da TR será uma ajuda e tanto. Executivos do setor alegaram que “uma poupança rentável demais” tira a competitividade dos Certificados de Depósito Bancário (CDBs), títulos com os quais captam dinheiro no mercado para emprestar a consumidores e empresas, e dos fundos de renda fixa, cujas carteiras estão abarrotadas de títulos públicos. Ressaltaram ainda que os ganhos dos CDBs e dos fundos são tributados enquanto os da caderneta estão isentos. E mais: se migrar dinheiro demais para a poupança, os bancos não conseguirão cumprir as exigências da lei, de aplicar pelo menos 65% dos depósitos no mercado imobiliário.

Os bancos esquecem de dizer, porém, que discriminam os pequenos investidores, justamente os que deixam suas economias na caderneta. Nos fundos, os bancos cobram taxa de administração anual de até 5%. Nos CDBs, chegam a pagar apenas 60% da taxa destinada aos grandes aplicadores. Por isso, muitas vezes, a rentabilidade dos fundos e dos CDBs têm ficado abaixo da poupança. Outra ressalva: em vez de correrem atrás de títulos públicos corrigidos pela Selic, sem risco algum, as instituições seriam obrigadas a aplicar em papéis com taxas pré-fixadas, a prazos mais longos. Certamente isso tornaria a gestão da dívida pública pelo Tesouro Nacional mais fácil e mais barata.
 
Socorro aos bancos

O Banco Central está preparando medidas para dar novo socorro aos bancos de pequeno e médio portes. Os focos principais serão as instituições que financiaram carros usados e hoje estão enfrentando uma onda de inadimplência (mais de 100 mil automóveis já foram devolvidos nos últimos meses, por incapacidade de pagamento). Segundo o diretor de Administração do BC, Anthero Meirelles, a meta é ampliar a capacidade desses bancos de emprestar. “O BC tomará medidas nessa direção”, afirmou, logo depois de um encontro do presidente do BC, Henrique Meirelles, com os cinco senadores que integram a Comissão Temporária de Análise da Crise do Senado Federal — Francisco Dornelles (PP-RJ), Pedro Simon (PMDB-RS), Aloizio Mercadante (PT-SP), Marco Maciel (DEM-PE) e Tasso Jereissati (PSDB-CE).

Pelos relatos dos senadores, o presidente do BC disse que o problema principal no financiamento de veículos usados foi resolvido com a compra do Banco Votorantim, que detém 40% desse mercado, pelo Banco do Brasil. Mas é preciso avançar mais. Desde que estourou a crise internacional, em setembro do ano passado, o BC injetou R$ 100 bilhões no sistema financeiro por meio da liberação de depósitos compulsórios e facilitou a compra de carteiras de crédito dessas instituições menores.

Apesar de o BC não ter detalhado as medidas, o presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), Renato Oliva, assinalou que qualquer ajuda é bem-vinda, pois a liquidez (quantidade de dinheiro em circulação) continua abaixo do período pré-crise. “Não podemos esquecer que 20% dos recursos ofertados pelos bancos até setembro vinham do exterior. E esse dinheiro praticamente desapareceu”, frisou. Ele destacou, no entanto, que os momentos mais críticos ficaram para trás, pois a demanda por crédito caiu bastante. “Ainda não equilibramos a oferta de crédito com a demanda, mas estamos perto.”

Na visão de Oliva, é importante que os bancos de pequeno e médio portes recuperem a plena capacidade de empresar, pois isso dará maior opção às empresas e aos consumidores. “Como a liquidez internacional não voltará tão cedo, as medidas do BC terão efeito importante. Mas é importante ficar claro que o sistema está sólido e sem problemas localizados”, emendou.(VN)